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quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Guerrilha

Dicionário de Política -- Norberto Bobbio

۩. A Guerrilha é um tipo de combate caracterizado pelo choque entre formações irregulares de combatentes e um exército regular. Os objetivos por ela perseguidos são mais políticos que militares. A destruição das instituições existentes e a emancipação social e política das populações são, de fato, os objetivos precípuos dos grupos que recorrem a esse tipo de luta armada. Por esse motivo, os termos Guerrilha e guerra revolucionária foram, cada vez mais, identificando-se.

A Guerrilha é típica dos Estados nos quais existem profundas injustiças sociais e onde a população está disposta a lutar por uma mudança.

As possibilidades de conduzir pesquisas para uma análise político-social neste campo são bastante problemáticas. Assim sendo, os estudos de cientistas políticos e sociais são poucos e gerais. Existe, porém, uma vasta produção de estudos políticos e militares que abordam a Guerrilha do ponto de vista prático a partir da condução das operações.

Querendo isolar as características principais da Guerrilha, é preciso concentrar-se em três setores de pesquisas que são intimamente conexos: relações entre guerrilheiros e população, aspectos estratégico-militares e ambiente físico.

O êxito dos movimentos de Guerrilha baseia-se, quase sempre, na longa duração do tempo de luta, visando isolar, moralmente, fisicamente e politicamente, os governantes da população e da comunidade internacional.

A Guerrilha muito prolongada torna-se possível com a ajuda da população, persuadida por uma ideologia conforme seus sentimentos, e da ajuda (sobretudo de armas) de potências externas. O apoio da população assume formas diversas, mas todas vitais: desde o fornecimento de bens e de alimentos, até a assistência aos guerrilheiros feridos; desde a organização de refúgios, até o trabalho como guias; e, finalmente, a recusa de divulgar informações às forças antiguerrilha.

O controle psicológico sobre as massas foi, por isso, considerado, juntamente com o controle das áreas rurais (o "campo"), o eixo principal da vitória dos movimentos de Guerrilha.

Segundo uma pesquisa corrente, verificou-se que, geralmente, 20% da população nas zonas de Guerrilha são favoráveis aos guerrilheiros, enquanto 20% são contrários e o restante 60% assumem atitude neutra e é, por conseqüência, alvo, seja da propaganda dos guerrilheiros, seja dos governantes. Uma atitude neutra torna-se, porém, uma vantagem para as forças de Guerrilha, porque significa uma não-colaboração com as forças do Governo.

A influência sobre a população é obtida de vários modos: com uma doutrina política que condena as injustiças sofridas pela população, com o terrorismo, com a demonstração da superioridade militar da Guerrilha sobre as forças regulares, com extensas campanhas de propaganda.

Do ponto de vista da conduta militar, a Guerrilha confia muito na improvisação e nas possibilidades de aproveitar a ocasião favorável. Os guerrilheiros fogem dos combates que não permitem agir em condições de superioridade. O bom conhecimento do terreno e o apoio da população permitem adotar uma tática que frustrae reduz ao mínimo o número dos ataques maciços do inimigo e desfecha golpes decisivos sob a forma de sabotagens e emboscadas contra as unidades isoladas do exército e da polícia, as linhas de comunicação e de fornecimento e as fontes de riqueza do Governo.

As grandes concentrações de forças por longos períodos são sempre evitadas, seja para não serem forçadas à defensiva, seja para criarem nas forças regulares a impressão de que a Guerrilha está em toda parte e em qualquer momento. Chama-se a isso efeito paralisante, que se obtém agindo sempre na ofensiva. A mobilidade do exército regular vem a ser assim notavelmente reduzida; as tropas são obrigadas a concentrar-se e devem limitar-se às atividades defensivas. Essa situação influi bastante na população, que vê assim o exército do Governo como incapaz de manter a ordem.

Entre as várias atividades dos guerrilheiros, figura também o terrorismo, que se desenvolve contra pessoas ou grupos diretamente ligados à classe que mantém o poder. O terrorismo pode também ser dirigido com fins punitivos contra a população de alguma zona ou vila que não queira colaborar com a Guerrilha. Sendo, porém, um índice de fraqueza, as forças guerrilheiras procuram fazer uso dessa técnica o menos possível, porque ela pode, de fato, provocar reações contrárias na população.

Com referência às forças de contraguerrilha, caracterizam-se por uma grande superioridade de armamento e têm condições de dispor sempre de meios cada vez maiores e mais eficientes. Tais forças, porém, terão sempre dificuldade, quando não impossibilidade em controlar contemporânea e continuamente todo o país, teatro de movimentos de Guerrilha.

O ambiente físico, o "terreno", no qual agiu até hoje a Guerrilha, foi sempre montanhoso e coberto de uma vegetação compacta. Esse terreno reduz a mobilidade dos grandes exércitos convencionais e dá às forças irregulares a vantagem de poder esconder-se sem dificuldade e de não ser distinguidas facilmente.

Os guerrilheiros utilizam bases (os chamados "santuários"), onde preparam os seus planos, formam seus homens e desenvolvem todas as atividades necessárias à preparação do combate. Essas bases devem ser particularmente seguras; por essa razão, encontram-se, muitas vezes, em território de Estados contíguos que aceitam ou toleram essas atividades.

Quando a atividade de Guerrilha consegue a formação de uma forte organização política com o apoio da população, os fatores naturais perdem quase toda a sua importância, enquanto assume peso muito maior o controle da população. Nesta altura, o apoio externo, material e político, torna-se patente e aumenta quando cresce a confiança nos êxitos da ação dos guerrilheiros.

A intervenção externa suscita considerações gerais sobre a função que a Guerrilha, fenômeno político interno, pode assumir no sistema internacional.

O potencial destrutivo das armas nucleares é de tal monta que alerta os Estados sobre a periculosidade de uma guerra aberta, por isso é provável que a Guerrilha seja a forma de violência mais aceitável, à qual podem recorrer potências antagônicas que, inserindo-se em conflitos internos, querem modificar a distribuição do poder existente em algumas regiões.

O que foi exposto indica claramente que as regiões nas quais a Guerrilha é possível são apenas aquelas economicamente subdesenvolvidas, com uma rede de comunicações pouco extensa e na qual exista uma ampla faixa da população sem nenhuma orientação política.

BIBLIOGRAFIA

ASPREY, R. B. War in the shadows; The guerilla in history. Garden City (N. Y.), Doubleday, 1971.

HALHWEG, H. Storia della guerriglia. Tattica e strategia della guerra senza fronti. Feltrinelli, Milano, 1973.

LAQUEUR, W. The origins of the guerilla doctrines. In: "JournaI of contemporary history", 1975, n 3.

Redator do verbete: Fulvio Attinà

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