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segunda-feira, 11 de agosto de 2008

"Passagens da Guerra Revolucionária", por Comte. Che Guevara - Alegria de Pío

Mês Cmte Fidel Castro






Alegria de Pío é um lugar da Província de Oriente, onde nós fomos surpreendidos no dia 5 de dezembro de 1956 pelas tropas da ditadura.

Já não restava de nossas equipes de guerra nada mais que o fuzil, a canana e algumas balas molhadas. Nosso arsenal médico tinha desaparecido, nossas mochilas tinham ficado nos pântanos, em sua grande maioria. Devido a nossa inexperiência , saciávamos nossa fome e nossa sede comendo canas na beira do caminho e deixando aí o bagaço; mas além disso, não precisaram os guardas da ajuda de pesquisas indiretas, pois nosso guia, segundo nós descobrimos anos depois, foi o autor principal da traição, os levando até nós. Tínhamos deixado o guia em liberdade à noite anterior, cometendo um erro que repetiríamos às vezes durante a luta, até aprender que os elementos da população civil cujos antecedentes se ignoram devem ser vigiados sempre que se esteja em zonas de perigo. Nunca deveríamos ter permitido que o nosso falso guia fosse embora.

O companheiro Montané e eu estávamos encostados num tronco, falando de nossos respectivos filhos; comíamos a ração magra -meia linguiça e dois biscoitos- quando soou um disparo; somente uma diferença de segundos e um furacão de balas -ou pelo menos isso pareceu a nosso angustiado espírito durante aquele teste de fogo- se alçava sobre o grupo de 82 homens. Meu fuzil não era dos melhores, deliberadamente tinha pedido assim porque minhas condições físicas eram deploráveis depois de um prolongado ataque de asma suportado durante toda a travessia marítima e não queria que se perdesse uma arma boa em minhas mãos.

Lembro-me que, no meio do tiroteio, Almeida -nessa época o capitão- veio ao meu lado para perguntar as ordens que havia mas já não havia ninguém lá para dá-las. Segundo descobri depois, Fidel tentou em vão agrupar as pessoas no no canavial próximo, ao que havia que chegar, cruzando o caminho que divide o canavial somente. A surpresa tinha sido muito grande, o tiroteio demasiado intenso. Almeida voltou aencarregar-se do seu grupo.

Tinha em frente uma mochila de medicamentos e uma caixa de balas, ambas constituam muito peso para transportá-las juntas; tinha diante de mim o dilema de minha dedicação à medicina ou meu dever de soldado revolucionário, levei a caixa de balas, deixando a mochila para cruzar o espaço que me separava das canas. Lembro-me perfeitamente de Faustino Pérez, de joelhos no caminho que divideo canavial, disparando sua pistola metralhadora. Perto de mim um companheiro chamado Arbentosa, caminhava na direção do canavial. Uma rajada que não se distinguiu das outra, nos alcançou aos dois. Sentium forte golpe no peito e uma ferida no pescoço; dei-me por morto. Arbentosa, vomitando sangue pelo nariz, pela boca e pela enorme ferida da bla querenta e cinco, gritou algo assim como "me mataram" e começou a disparar loucamente pois não se via ninguém naquele momento. Disse a Faustino, dede o chão, "me prejudicaram" (mas mais forte a palvra), Faustino deu-me uma olhada no meio da sua tarefa e me disse que não era nada, mas em seua olhos se lia a condenação que significava a minha ferida.

Fiquei caído, disparei um tiro na direção do monte seguindo o mesmo escuro impulso do ferido. Imediatamente, pus-me a pensar no melhor modo de morrer nese minuto em que parecia tudo perdido. Alguém, de joelhos, gritava que tínhamos que nos render e se ouviu atrás uma voz, que depois soube pertencia a Camilo Cienfuegos, gritando: " Aqui ninguém se rende..." e um palavrão depois. Ponce seaproximou agitado, com a respiração ansiosa, mostrando um balaço que aparentemente lhe atravessava o pulmão. Me disse que estava ferido e lhe manifestei, com toda indiferença, que eu também. Ponce continuou rastejando em direção ao canavial, assim, como outros companheiros ilesos. Por um momento fiquei só, recostado ali esperando a morte. Almeida chegou perto de mim e me deu ânimo para continuar; apesar das dores, o fiz e entramos no canavial. Lá eu vi o grande companheiro Raúl Suárez, com seu dedo polegar destroçado por uma bala e Faustino Pérez vendando-o junto a um tronco; depois tudo se confundia no meio das avionetas que passavam baixo, lançando alguns disparos de metralhadoras, semeando mais confusão entre cenas as vezes grotescas, como a de um robusto combatente que queria se esconder atrás de umas canas, e outro que pedia silêncio entre o tremendo labirinto de tiros, sem se saber bem por que razão.

Formou-se um grupo conduzido por Almeida e no que estávamos também o hoje Comandante Ramiro Valdés, naquele tempo tenente, e os companheiros Chao e Benítez; com a Almeida à cabeça, cruzamos o último caminho do canavial para alcançar um monte salvador. Nesse momento se ouviam os primeiros gritos: "fogo", no canavial se levantavam colunas de fumaça e fogo; embora isto não posso assegurar, porque pensava mais na amargura da derrota e na iminência de minha morte.

Caminhamos até que a noite nos impediu avançar e resolvemos dormir todos juntos, amontoados, atacados pelos mosquitos, torturados pelasede e a fome . Assim foi nosso batismo e fogo, no dia 5 de dezembro de 1956, nas proximidades de Niquero. Assim começou a forja do que seria o Exército Rebelde.

Próxima passagem: À Deriva

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